Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria nesta sexta-feira (25) para que aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) tenham direito à chamada “revisão da vida toda”.

Essa revisão poderá ser pedida pelos trabalhadores que começaram a contribuir para o INSS antes de 1994 e que se aposentaram depois de 1999. Leia detalhes mais abaixo.

Naquele ano, o cálculo do valor dos benefícios começou a ser feito considerando apenas os valores recolhidos depois da criação do Plano Real – ou seja, para calcular a média dos salários que servirá como base de pagamento da aposentadoria, o instituto usa apenas os pagamentos em reais.

A ‘revisão da vida toda’ é um novo cálculo da média mensal, que vai considerar todos os salários do trabalhador, mesmo os anteriores a julho de 1994, feitos em outras moedas, como o cruzeiro real e o cruzeiro.

Decisão ainda não está valendo

O julgamento foi definido pelo voto do ministro Alexandre de Moraes e terminou em seis votos favoráveis contra cinco contrários. A decisão pode ser aplicada para todos os processos sobre o tema no país.

No entanto, ainda é preciso aguardar a publicação da decisão, porque o julgamento no plenário virtual está previsto para ser finalizado até o dia 8 de março.

Não cabe mais recurso do INSS, só embargo de declaração, mas isso não muda o julgamento, destaca João Badari, advogado especialista em direito previdenciário e sócio do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados.

“Até lá algum ministro pode mudar o voto, mas isso é muito difícil de acontecer”, afirma.

O julgamento começou em junho do ano passado, quando o então relator, ministro Marco Aurélio Mello, fixou a tese vencedora.

Segundo ele, na revisão dos benefícios de aposentados e pensionistas do INSS, deve prevalecer a aplicação da regra que considera todas as contribuições no cálculo do benefício e não apenas as feitas depois de julho de 1994, quando o resultado for mais favorável ao segurado.

Para quem vale a pena a revisão

João Badari explica que a revisão só beneficia quem tinha altos salários antes de 1994 e cujas contribuições, ao serem computadas na aposentadoria, farão diferença no cálculo do valor.

De acordo com ele, trabalhadores que ganhavam menos não terão vantagem – se forem incluídas as remunerações antigas de baixo valor, isso poderá diminuir a aposentadoria recebida hoje.

“Revisão da vida toda é uma ação de exceção. O segurado deve atender a esses requisitos para não ser prejudicado. Além disso, é preciso fazer os cálculos, pois não compensa para todo mundo”, afirma.

Badari explica que, além do fator previdenciário, que diminui o valor mensal em razão da idade, expectativa de vida e o tempo de contribuição, os valores anteriores a 1994 não fazem parte do cálculo realizado, diminuindo o valor mensal inicial pago como benefício.

“Para muitos segurados que recebiam salários altos antes de 1994, o valor do benefício foi consideravelmente prejudicado”, disse.

Quem pode pedir

De acordo com Bandari e a advogada especialista em direito previdenciário Priscila Arraes Reino, para se beneficiar da “revisão da vida toda”, é preciso preencher os seguintes requisitos:

  • Ter aposentadoria com data de início entre 29/11/1999 e 12/11/2019, para que tenha havido a aplicação da regra de transição contida no artigo 3º da Lei 9.876/1999 – neste caso, a média salarial calculada pelo INSS para pagar a aposentadoria foi feita com os 80% maiores salários desde julho de 1994, quando o Plano Real passou a valer;
  • Ter recebido o primeiro pagamento do benefício nos últimos 10 anos, desde que seja antes da reforma da Previdência, que entrou em vigor em novembro de 2019;
  • Ter começado a contribuir com o INSS antes de julho de 1994.

Pode pedir a revisão somente quem recebeu o primeiro pagamento do benefício previdenciário nos últimos 10 anos, em razão do prazo decadencial. Esse prazo é contado a partir do mês seguinte à data em que o segurado recebeu a primeira aposentadoria.

Caso o segurado tenha feito algum pedido de revisão nos últimos 10 anos, o prazo é interrompido e só recomeça a contar depois da resposta do INSS. Se o instituto não se manifestou sobre o pedido de revisão, o protocolo pode ser usado como prova.

“Por isso, é importante ingressar com ação na Justiça o mais rápido possível para conseguir ter o direito julgado de acordo com a decisão da corte superior”, orienta Badari.

Caso o aposentado há menos de 10 anos queira revisar seu benefício, deverá realizar um cálculo prévio com a conversão das moedas anteriores para verificar se realmente o benefício será aumentado.

Quais benefícios podem ser revistos?

Os benefícios do INSS que podem ser contemplados com a “revisão da vida toda” são:

  • aposentadoria por idade
  • aposentadoria por tempo de contribuição
  • aposentadoria especial
  • aposentadoria da pessoa com deficiência
  • aposentadoria por invalidez
  • pensão por morte

Como pedir a revisão

Para pedir a “revisão da vida toda”, os segurados devem ingressar com uma ação levando em conta as seguintes situações:

  • Juizado Especial Federal, quando o valor da causa é até 60 salários mínimos;
  • Justiça Federal, quando o valor da causa é acima de 60 salários mínimos.

Segundo João Badari, os documentos necessários para ingressar com a ação são:

  • CNIS, que é o extrato previdenciário com registro de todas contribuições previdenciárias: os vínculos nos empregos, afastamentos, contribuições devem estar corretamente registrados. O documento pode ser encontrado no portal meu.inss.gov.br ;
  • RG e CPF;
  • Comprovante de residência (atualizado e em nome do segurado);
  • Carta de concessão da aposentadoria, ou processo administrativo da concessão (caso não tenha esse documento, seu advogado saberá como obter).

O escritório de advocacia Arraes e Centeno ressalta que, em alguns casos, as microfichas de contribuição (informações registradas no banco de dados da Previdência Social) podem ser essenciais para os cálculos da “revisão da vida toda”, pois o CNIS só registra salários de contribuição a partir de janeiro de 1982. Mesmo que tenha passado muito tempo, desde 1968, o INSS tem a obrigação de ter essa documentação guardada em microfilmagem.

Para ter acesso às microfichas de contribuição, é necessário requerer diretamente ao posto previdenciário. Caso o INSS não apresente ou não tenha feito a microfilmagem, pode responder por uma indenização de danos morais.

O que fazer agora?

Badari explica que quem não entrou com ação ainda tem que fazer um cálculo prévio para ver se vale a pena fazer o pedido de revisão.

“Quem já está com processo aberto pode pedir para o juiz antecipar a decisão e já começa a receber, isso no caso das pessoas que já sabem que terão aumento dos valores com a revisão”, diz.

O julgamento é de repercussão geral. Isso significa que a decisão do STF será válida para todo o país, seguida por todas as instâncias. Assim, todos os processos que estavam aguardando o julgamento irão andar novamente, e ao final deles, os pagamentos serão liberados, mas isso vai levar um certo tempo, destaca o escritório Arraes e Centeno.

Quem entrou com ação na Justiça deve procurar seu advogado para conferir como será o andamento final do processo.

Aos que ainda não entraram com ação, mas estão perto de completar os 10 anos de recebimento da primeira aposentadoria, é preciso atenção para não correr o risco da decadência de direito, que é o prazo fatal para o pedido na Justiça.

Se o segurado tem certeza que não corre o risco da decadência e acha que a inclusão dos períodos anteriores a 1994 podem melhorar sua aposentadoria, deve organizar os documentos e fazer os cálculos.

Valores chegam a R$ 20 mil

Além de ter o benefício revisado, aumentando o valor mensal, o segurado que pedir a revisão receberá os atrasados dos últimos 5 anos, ressalta Badari. Ele afirma que a maioria de atrasados tem valores entre R$ 10 e R$ 20 mil.

O advogado dá como exemplo um aposentado que ganha R$ 2 mil por mês. Se ele ganhar a revisão da vida toda e o benefício dele subir para R$ 2.400, os R$ 400 de diferença que ele perdeu a cada mês serão multiplicados por 5 anos, ou seja, 60 meses, o que dará R$ 24 mil, mais juros e correção.

Para o valor é contabilizado ainda o tempo que durar o processo. Se durou, por exemplo, dois anos, os R$ 400 são multiplicados por 24 meses, o que dá R$ 9.600, mais juros e correção.

Revisão não é para todo mundo

Diego Cherulli, vice-presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), alerta que não é todo mundo que será beneficiado por essa revisão, uma vez confirmada pelo STF. “Ela se aplica para alguns casos específicos como, por exemplo, quem trabalhou contribuindo pelo teto até 1994, saiu desse emprego e acabou recolhendo pelo mínimo ou em valor menor”, explica.

Na vida laboral é comum que o salário do trabalhador suba gradativamente ao longo da vida, em razão até mesmo da maior experiência adquirida. Por esse motivo, a “revisão da vida toda” não se aplica para qualquer pessoa. Ela vale, por exemplo, para pessoas que começaram a trabalhar recebendo mais e, ao longo dos anos, foram para empregos que trouxeram uma renda menor. Ou seja, não vale para o aposentado há menos de 10 anos cujo valor da renda não caiu. Por isso, é importante fazer os cálculos antes de ir à Justiça. Em muitos casos, o valor do benefício pode diminuir com a revisão.

“Jamais peça revisão sem fazer cálculos para avaliar se de fato haverá aumento do seu benefício”, alerta Priscila Arraes Reino.

Segundo Cherulli, para saber se vale a pena entrar com a ação, é importante simular o cálculo com a ajuda de um especialista para saber o que é mais vantajoso: o cálculo do INSS ou o cálculo com todo o período contributivo. “Quem tem baixos salários anteriores a julho de 1994 costuma não obter vantagem econômica na revisão”, aponta.

Entenda a ‘revisão da vida toda’

Tudo começou com a Lei 9.876/99 que modificou a regra de cálculo para os benefícios, entre eles as aposentadorias. Antes desta lei, todos os benefícios eram concedidos com base nas últimas 36 contribuições existentes nos últimos 48 meses antes do pedido de aposentadoria.

Foram criadas, então, duas regras, a definitiva e a regra de transição. Na regra de transição, utilizada para o cálculo de todos os benefícios de quem já estava contribuindo com o INSS antes da nova regra, só deveriam ser considerados os salários de contribuição a partir de julho de 1994.

Por outro lado, a regra de cálculo definitiva, válida para quem entrasse no INSS depois, previa a inclusão de todos os salários de contribuição de toda a vida para cálculo de benefícios.

INSS, desde então, sempre considerou somente as contribuições de julho de 1994 para a concessão de todos os benefícios.

Segurados dentro da regra de transição que teriam um benefício maior caso estivessem dentro da regra definitiva passaram a pedir na Justiça a revisão dos benefícios, solicitando a utilização da regra de cálculo definitiva e não de transição.

Em dezembro de 2019, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que era possível a aplicação da regra definitiva e não a regra transitória de cálculo, caso resultasse em benefício mais vantajoso ao segurado.

Depois do julgamento do STJ, faltava somente o julgamento do STF para colocar um ponto final na espera dos milhares de segurados que aguardam com seus processos de revisão parados.

Fonte: G1 Marta Cavallini, 25/02/20222

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