Prestes a completar dois anos em fevereiro, o Open Finance teve adesão de cerca de 9% dos brasileiros que possuem conta bancária, o equivalente a aproximadamente 17 milhões de usuários ativos. Com o intuito de incentivar a competitividade no Sistema Financeiro Nacional (SFN), o sistema bancário aberto, que permite o compartilhamento de dados bancários pessoais, promete promover melhores ofertas de produtos, serviços personalizados e menores custos, trazendo para os clientes mais autonomia sobre sua vida financeira, uma vez que as informações só são compartilhadas mediante a autorização.

Diferente do Pix, que se consolidou como o meio de pagamento mais usado no país, a nova aposta do Banco Central (BC) não decolou com tanta rapidez. Embora já conte com cerca de 800 instituições participantes, são poucas as que oferecem serviços ao consumidor. Em algumas já é possível, por exemplo, fazer Pix usando o saldo de outra conta bancária. Em outras, as informações compartilhadas servem para ofertar produtos e serviços mais adequados ao perfil do cliente. Por se tratar de algo novo, as companhias e clientes têm tido cautela.

Segundo Lígia Novazzi, COO & Sócia da Teros, plataforma de gestão de dados, o objetivo do compartilhamento de dados é diminuir a assimetria de informação entre empresas financeiras e os consumidores. “O Open Finance deve gerar um aumento da oferta e do acesso aos serviços financeiros. Por exemplo, deve ficar mais fácil conseguir empréstimos ou aumentar seu limite de crédito. Além disso, com maior concorrência, a qualidade deve aumentar, ao mesmo tempo que eles se tornarão mais baratos para os brasileiros”, explica.

Novazzi destacou que, em linhas gerais, não oferece desvantagem ao cliente. “Mesmo em uma situação, por exemplo, que a pessoa está endividada, ela pode compartilhar seus dados para obter ofertas de renegociação de dívidas de diferentes agentes financeiros e comparar qual a melhor para ela. Se há alguém que sai em desvantagem, e isso também pode ser questionado, são os grandes bancos que por muito tempo foram os únicos a aproveitar as ricas informações de seus clientes”, afirma.

De acordo com a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), desde a entrada dos indicadores no início de 2022, foram registradas 10,8 bilhões de chamadas bem-sucedidas entre os participantes para o compartilhamento de dados, que deverão aumentar gradativamente ao longo dos próximos anos, a partir da ampliação de oferta e confiança por parte dos usuários.

O Open Finance nada mais é do que uma extensão do Open Banking, que permitia ao cliente levar seu histórico financeiro de uma instituição para outra, e agora tem um número de entidades regulamentadas pelo Banco Central (BC) que podem acessar seus dados. O sistema bancário aberto existe no mundo todo e o Brasil é considerado um dos países que está à frente neste processo. O Reino Unido foi o pioneiro em implantar um sistema parecido, em 2018. A Austrália implementou a primeira fase do seu programa em julho do ano passado, a Índia também já deu os primeiros passos. Países como Estados Unidos, Canadá e Rússia também estão analisando maneiras de incorporar o compartilhamento de dados aos seus sistemas financeiros.

Segurança de dados

Uma das grandes questões acerca da popularização da ferramenta é a desconfiança dos clientes. A psicóloga Fernanda Martins, 32 anos, conta que recebe diversas ofertas em seus aplicativos bancários para permitir o compartilhamento, mas tem receio de entrar no sistema. “Com tantos golpes na praça hoje em dia eu, realmente, tenho medo de autorizar que compartilhem meus dados”, diz.

Para ela, ainda falta clareza sobre a ferramenta. “Por mais que eu saiba que seja uma espécie de modernização do sistema bancário, das ofertas que recebi, até hoje não me veio uma finalidade clara das vantagens que posso ter, permitindo que outras instituições financeiras possam ter acesso aos meus dados”, acrescenta.

Segundo o BC, o Open Finance funciona dentro dos preceitos da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e demais regulações pertinentes à segurança dos dados, com a fiscalização dos consentimentos e da proteção dos dados, de acordo com as normas já em vigor. “O consentimento dado pelo cliente deverá ser usado pela instituição somente para a finalidade específica na qual foi autorizada e dentro do período escolhido, não podendo, qualquer instituição fazer o uso das informações para outra finalidade”, salienta o BC.

“Sim, é seguro. O risco de vazamento de informações é baixíssimo”, assegura a COO & Sócia da Teros. No entanto, recomenda que o cliente se informe. “É preciso ler quais as condições de uso de dados que você está consentindo e estar realmente conforme as condições”, complementa.

Para Miguel José Ribeiro de Oliveira, diretor executivo de Estudos e Pesquisas Econômicas da Associação Nacional de Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), havia uma expectativa de adesão maior por parte dos clientes. “A culpa disso é que falta um pouco mais de informação por parte dos bancos em suas campanhas. As pessoas ainda estão em fase de entendimento de que quanto mais informações você tiver incorporadas, mais o sistema financeiro se tornará competitivo, com a capacidade de ofertar melhores condições”, destaca.

Ele avalia o sistema como um grande desburocratizador. “Com essas informações disponíveis, os bancos vão disputar o cliente já conhecendo o seu perfil. Então ele não vai mais precisar bater na porta do banco atrás de vantagens, o banco vai procurá-lo para oferecer ofertas.”

Novidades para investidores

Os dois primeiros anos de implementação das quatro fases do Open Finance no Brasil foram marcados pelos ajustes de questões técnicas centrais da infraestrutura, da fase 2 (compartilhamento de dados), e iniciação de pagamentos da fase 3, estabilização das APIs (Application Programming Interface, é a linguagem que permite que outras plataformas possam comunicar-se entre si), além de melhorias em uma série de processos internos do ecossistema.

De acordo com o BC, o sistema foi encarado como um projeto de médio a longo prazo, e a adesão está dentro das expectativas, tanto por sua complexidade quanto pela amplitude da mudança que provoca no sistema financeiro. “Seus maiores efeitos, como redução da assimetria de informação, ocorrerão de forma gradual, sendo que esses dois primeiros anos são vistos ainda como de estruturação desse ecossistema”, destacou a autoridade monetária, em nota.

Facilidades

Em 2023, serão discutidas as especificações técnicas da fase 4 para implantação até o meio do ano, são elas: possibilidade de clientes compartilharem dados transacionais de investimentos, câmbio, credenciamento, seguros, capitalização e previdência; novas funcionalidades de pagamento voltadas às empresas; melhorias na jornada de compartilhamento de dados e de pagamentos; e melhorias de governança da própria estrutura do Open Finance.

Para a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), as expectativas quanto à implantação completa do sistema bancário aberto são positivas. “A Federação avalia que o trabalho realizado nos dois primeiros anos de implementação está dentro do esperado pelas instituições, dada a complexidade do projeto, que passou por ajustes em seu calendário, necessários dentro de uma infraestrutura dessa magnitude e em execuções dessa dimensão, sejam regulatórias ou de natureza privada. Mas o setor bancário continua engajado com a iniciativa, que trará mais conveniência para seus clientes, além de oportunidades e melhores ofertas de produtos e serviços para o mercado.”

Fonte: Contec, 31/01/2023

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